domingo, janeiro 23

A percepção de um forasteiro na Periferia do Rio de Janeiro PARTE 1

Na minha cabeça a minha mãe era a personagem Jo Penteado, interpretada pela Christiane Torloni, da Novela A Gata Comeu, ou a Regina Duarte em Malu Mulher, ou a personagem Tancinha de Sassaricando, que ela diz só não ter aceitado o papel oferecido pelo Boni, porque não poderia sair do Rio durante um ano e assim não poderia nos ver, essa história foi tão estranha, quanto a do atropelamento, que ela conta que sofreu, justo no dia em que ela havia tirado o dinheiro do banco para comprar o meu prometido vídeo game Atari. Que foi o meu falecido pai que acabou me dando depois.
Lembro que a primeira vez que vim para o Rio, eu estava desempregado e vim passar um tempo com a minha mãe que morava numa vila, na 18 do forte em São Gonçalo, achei um pouco estranho, porque minha mãe sempre gritava aos quatro ventos que morava no Rio, e quando cheguei e vi, aquilo não exatamente o cartão postal que eu assistia nas novelas da televisão, mas ao mesmo tempo era muito familiar a casa da Cohab que eu morava com meu pai no Estado de Santa Catarina.
A vila em São Gonçalo, eram casinhas quase que coladas uma na outra. Antes da crise, da separação dos meus pais, a gente morava numa casa simples, porém perto da orla de Balneário de Camboriú em SC.
E eu achava normal e imaginava que todo mundo tinha uma moradia assim, uma casa de varanda com quintalzao. Babá. Café da manha com direito a suquinho de laranja, pão quentinho com frios, frutas e bolos. Início dos anos 80 e nem sabia que o Brasil estava em plena ditadura militar. Meu avo, nunca me explicaram direito, mas acho que ele era um tipo de médico legista, porque tinha fotos dele ao lado de cadáveres.
Minha mãe não era exatamente a mãe exemplar, talvez por isso me sentia mais seguro com meu pai, embora nessa época gostasse mais dela, ela era linda, saía para dançar sozinha, no sábado a noite, (meu pai estava viajando, ficávamos com a babá, acho que o casamento já não ia bem,) ou ela ia pro cantão da praia com os amigos, ela nunca gostou de beber mas na época, todos seus amigos adoravam um cigarrinho do capeta. Nessa época que ela conheceu meu padrasto, negro e carioca, ela diz que ele a libertou dos “vícios”, em troca ela, bem dizer arranca-o dos braços da sogra dela e termina de criá-lo, pois ele tinha só 16...
E meu pai terminou de nos criar, a mim e a minha irma de 6 e 7.
Meu padrasto é legal, pasmem-se ele está junto com minha até hoje. O irmão dele era surfista, e uma vez brigamos e o xinguei: - Cachorro! Lembro que queria gritar: - preto! Como se isso fosse um defeito, tamanho era preconceito intrínseco a mim, ele que me ensinou a surfar.
Meu pai de um jipe que tinha, na época que eu nem era nascido, agora, já metade dos anos 90, tinha um fusca 65, depois um Fiat Oggi sei lá de que ano. Nunca me liguei em carros. A ponto de entrar num de carona e quando descer, é que eu vou lembrar que marca, e tipo e cor. Deve ser do ar que eu aspirei nas conversas embaladas de mamae na praia.
Mas gostava das miniaturas Rei, “carrinho de ferro” que ganhava de meu pai, com o luxo de poder escolher os modelos por um mini catálogo que acompanhava cada um, ao todo ganhei 4.
Meu velho havia sido contemplado em 1984, por um plano de habitação popular. Da orla, passamos a morar na Cohab São Vicente, Rua Palhoça no bairro chamado Rio Bonito, na cidade vizinha, Itajaí. Haviam três tamanhos de casas, elas eram de alvenaria, caiadas de branco com as janelas pintadas de marrom: as pequenas, azuis: as médias e verde: as grandes ou vice-versa. A nossa era média, só que as mensalidades eram todas muito baixas. Meu pai casou-se de novo em 1990. Ele merecia ser feliz também 17 anos, antes de perder tudo em 2007 e de ter falecido de câncer na bexiga. Em 94 foi a vez da minha Irma. Se casar.
Voltemos a Sao Gonçalo. Eu com 19 anos, reconhecendo um Rio de Janeiro periférico que achava que nem existia nos meus mapas, com pessoas simples, como eu. Com pessoas bronzeadas mostrando seu valor, sim porque na minha cidade eu nao via negros e negras tão lindos assim, quando tinha gente de cor elas tentavam se embranquecer nas atitudes e nos cabelos, ou eram olhadas atravessadas mesmo, como se sentissem-se culpados por não herdarem as feições anglo saxônicas das fadas e “Xuxas” e das representações dos “Jesuses” nas folhinhas, imagens a que somos submetidos desde sempre, no caso de algumas cidades do sul, além disso, só há loros e loras de olhos azuis em todo lugar, como se fosse um erro ser diferente. Eu por exemplo, sou um erro, um japa meio sensível, que vai nascer em Blumenau, cidade alemã, da Oktoberfest, e vem parar no Rio de Janeiro, com muitos sonhos na bagagem.
Em São Gonçalo, no Mutuá, Trindade, adorava a praça do Rodo, fiz amigos, como o Mokoshock, que fazia umas iradas e ria, ele achava manero os meus passos improvisados de break dance, e realmente eram, eu minha Irma e mais duas colegas, fizemos até coreografia do Michael Jackson, ;que eu adorava! para apresentar na escola, na época do álbum Bad, meu padrasto que havia se formado técnico de eletrônica curtia MJ, Barry White, Dione Wharwick, Donna Summer e eu ouvia desde a infância muita Black music por tabela. Fui passear com minha mãe e sozinho em Niterói, Campo de São Bento, Forte de Santa Cruz, o Plaza Shopping, a praça do Índio de Araribóia, tinha um centro cultural, expus minha vontade de expor meus desenhos, que uma vez expus nas areias de Copa e minha mãe fotografou, me sentia muito artista e minha mãe me incentivava.

Voltando ao terraço da 18 do forte, onde minha mãe morava e também era a S.O.S eletrônica, do meu adrasto, uma vez assisti um dos últimos shows dos Mamonas, no Clube Mauá, de cima dum terraço, e quase me queimei com o Bombril que acendi, para chamar atenção deles, para que eles me vissem, acho que não deu certo.
Fui ao meu primeiro baile funk, terraço Hollywood, ainda lembro - MC Cebola, até pouco tempo, guardava ainda o flyer da festa. Me aventurava, às vezes sozinho pra conhecer praias, como a da Luz, Adao e Eva, Camboinhas, e as minhas preferidas até hoje, que só fui uma vez e que nunca mais voltei, porque? Será que estou me castigando? Piratininga e dunas de Itaipú, também nunca entrei ainda no museu de Arte Contemporanea de Niterói. Lembro do Bay Market, onde vi dois meninos, cantando, parecia, por que não tinham peitos, depois descobri que eram meninas Pepe e Nenem. Ouvia muito pagode, pra dormir a noite nas rádios, e sentia que as pessoas realmente viviam aquilo, tava na pele, Só pra Contrariar, Soweto. E eu já estava apaixonado pela perifa e não sabia.
Lembranças boas, ganhei meu primeiro concurso de quadrinhos pela prefeitura de São Gonçalo, e também ilustrei uma série de duas matérias sobre contrabando de órgaos pro Nosso Jornal de São Gonçalo por dez reais cada.
Nas minhas andanças para o centro do Rio, tudo me surpreendia a começar o numero de pessoas, ainda não ligava um lugar ao outro e ficava mais nas imediações da praça xv, antigo museu da imagem e do som, onde uma vez vi um quadro feito a caneta bic vermelha e azul , desenho de uma grávida em várias posições que me emocionou, ao ouvir A música Voce é linda do Caetano Veloso, que eu já curtia, era a exposiçao 80 artistas interpretando Caetano com suas obras, 80 musicas dele, – você é linda a sala de cinema no paço imperial, onde assisti o Oposto do Sexo com Cristina Ricci.
Uma vez quis ir para Jacarepaguá de onibus para comprovar a música que cita: Jacarepaguá é longe pra caramba, boate 1140 e era mesmo, beijei alguém naquela noite que era a cara de uma estrela de novela, quando a vi 4 depois, fraco de bebida e de substancias que sou, pensei que devia ter bebido um pouco naquela noite pra achar isso. Fui pra Copa passar o Reveilon de 94 pra 95 sozinho, ficaria no apto do pai da dona Fátima, vizinha evangélica da minha mae, que era mãe do Mokoshock e nessa época já começava a corrompe-la, minha mãe que de uma ex-hipponga transgressora, siliconada sexy, cuja melhor amiga no início do anos 80 era uma travesti de nome Gretchem, começa a passar a ser uma madalena arrependida, chorando suas pitangas e lamúrias a ponto de às vezes eu ter que sair de perto por não ter paciência de ouvir as mazelas desimportantes de uma crente caretona, sendo que a vida é muito mais louca, e por isso menos culpada e mais interessante.
Depois de quase um ano... Quando votei pro sul, o desenho me levou a uma agencia de publicidade, onde fui feliz durante alguns anos, nas férias lembro que voltei Rio em 98, 2003 e 2005.
A cada volta, a vontade de ficar mais um instante, amores de verão . “

Cariocas são bonitos, cariocas são sacanas, cariocas são bacanas, cariocas são dourados”...
E em 2005 conheci a Lapa e tomei um choque de cultura. Comecei a nutrir a possibilidade de morar um dia no meio daquele turbilhão, mas nem sabia como, miha vida estava meio conturbada após meu pai morrer e eu ser demitido da TV onde fui editor por vários anos. Não tive dúvida. Não queria fazer como meu pai, embora ele foi a pessoa mais honrada e honesta que conheci (eu só não entendia a sua frase de que o homem nunca deve deixar de por um cinto, ele dizia), e junto com minha mãe me ensinaram princípios, não pegar uma moeda se não for sua. Por isso já fui zoado muitas vezes, sofri chacota, e fui chamado de troxa por colegas por devolver a cantina da escola,troco dado a mais, por exemplo. Ele vendia livro jurídicos, embora era um ótimo artista desenhista. Talvez para terminar de nos criar, ele nunca foi atrás dos seus sonhos.
Já eu, Menino Maluquinho, me desfiz de tudo, acredito na minha vocação, então doei minha roupas, meus eletro eletrônicos, discos DVD muito barato vendi minha Bizz a um grande amigo, bicicleta 18 marchas, vídeo games, tudo que havia adquirido honestamente com muito esforço e trabalho duro. Um exercício de desapego, que estava exercitando, uma vez vi o Miguel Falabella, falar que fez isso, numa entrevista, isso não me saiu da cabeça até eu poder fazer também, tem sido um exercício constante na minha vida. Estava confortável, ficar lá. Mas eu queria esquecer uma paixonite, e principalmente obedecer a um chamamento. Não me arrependo, esses anos tem sido muito ricos de aprendizagem pro caminho artístico que escolhi seguir estudando, o Teatro.
Pois é, em 2008, cheguei com o seguro desemprego, E quando desci da rodoviária peguei um táxi, pensando em me hospedar em Copa, quando desci vi que era totalmente inviável. Tentei ligar para vários amigos virtuais, Globais, de Leblons e afins.
Quem me estendeu a Mao? Até ali ele era apenas um virtual amigo que eu havia add no Orkut em 2005, O Gabeh um puta cara talentoso, canta fados! Divertido, humano, principalmente se mostrou muito gente boa... ele diz ninguém é perfeito referindo-se a ser ex-BBB. Mas bate no peito com orgulho por ser SUBURBANO sim, e também negro, gay assumido, e não tem problema nenhum com seu excesso de gostosura! De madrugada, ele me orientou por telefone a e pegar de Copacabana, o ônibus que me levaria até um lugar chamado Engenheiro Leal, perto dum lugar de nome engraçado, Cascadura. Fiquei um final de semana na casa do meu amigo ex-BBB que é até hoje literalmente um Big brother para mim. Seus pais haviam viajado, por isso coube mais um. A casa era bem, pequena, ele os irmãos e os pais morarem. Mas havia muito amor naquela casa!!! Para ir a escola de música onde ele lecionava, tinhamos que pegar tipo um trem mais ônibus +um metro. Dois dias depois, ele me orientou e eu fiquei no Hotel Carioca, por dois dias.
Circulamos no Restaurante Massape da Gomes Freire, e me apresenta o melhor pudim de leite do Rio, come churrasquinho em Cascadura, tira fotos no Norte Shopping, ou vamos num aniversário estranho com gente esquisita no 00 na Gávea, rindo das poses de pessoas que se acham só por dormirem e cagarem numa parte do mapa, quando na verdade o território é de livre circulação de todos, ou seja é nosso, é meu também ou não é nosso é de todos é de ninguém.

não se choque

nu viemos ao mundo e nu iremos

Kem sou eu

Minha foto
rio de janeiro, rj, Brazil
Registrado no Ministério do Trabalho - Superintendência Regional do Trabalho e Emprego / SC - como ator sob o número: 7633 SC. e Editor profissional de TV / cinema nascido em Blumenau. Produtor Cultural, há 7 anos aprimorando os estudos no Rio de Janeiro, São Paulo e Recife, volto agora a cidade que me adotou, Rio. Me chame e vamos trabalhar

que bom te sentir

sentir sentir sentir ... não mais senti sem ti ...volta

Tetsuo posando de Modelo Vivo

Tetsuo posando de Modelo Vivo
Desenho de Paulo Meirelles